Festival das Dispensas de Licitação: Prefeitura de Tabatinga na mira do TCE, do MP e da Polícia Federal
Amazonas – O Portal e TV CM7 Brasil tem acompanhado de perto a movimentação financeira de algumas prefeituras do interior do Amazonas. E, como era de se esperar, a prática da dispensa de licitação tem sido uma constante em diversas cidades do estado. O mecanismo, que deveria ser uma exceção, tornou-se regra. O que impressiona não é apenas a quantidade dessas contratações, mas também os valores astronômicos e os beneficiários dessas “facilidades administrativas”.
Mas foi em Tabatinga que a coisa saiu completamente do controle. Em menos de um mês, o atual prefeito, Plinio Souza da Cruz, assinou nada menos que onze dispensas de licitação. O montante total dessas contratações soma mais de R$ 4 milhões em apenas 30 dias de mandato. Isso mesmo: o prefeito entrou no cargo já com a caneta afiada para autorizar contratações diretas.
Onde foram parar os milhões?
As empresas beneficiadas atendem aos mais diversos setores. Tem de tudo: gráfica, produtos alimentícios, locação de palcos e som para o aniversário da cidade, materiais descartáveis, fornecimento de refeições, aquisição de materiais de higiene e limpeza, locação de veículos, passagens aéreas, e até R$ 600 mil para a compra de urnas funerárias. Sim, até morrer está ficando caro em Tabatinga.
Mas o caso mais curioso (para não dizer escandaloso) envolve a empresa Posto Irmãos Nunes Comércio Varejista de Combustível LTDA. O objeto da contratação é a aquisição de gás liquefeito de petróleo (GLP) de 13kg e recarga de GLP. O valor inicial publicado no Diário Oficial assustou: R$ 459.500.000,00 (quase meio bilhão de reais). No entanto, após repercussão negativa, o número foi corrigido para R$ 459.500,00. Um “erro de digitação” que, curiosamente, colocaria Tabatinga no ranking das cidades que mais gastam com gás no país.
O posto de combustível que vende gás, mas sem autorização
Agora vem a cereja do bolo: a empresa contratada sequer possuía autorização de funcionamento emitida pela ANP, um requisito essencial para esse tipo de fornecimento. Além disso, não apresentou os índices contábeis exigidos, não teve sua habilitação técnica devidamente comprovada e foi inabilitada por irregularidades no alvará de sua filial em Manaus. Ou seja, uma empresa sem documentação regular foi beneficiada com um contrato milionário, sem concorrência, para fornecer um produto essencial. Isso levanta sérias dúvidas sobre a lisura do processo e coloca em risco o fornecimento adequado do serviço.
Prefeito recém-empossado, mas velho conhecido da administração
O detalhe mais interessante é que o prefeito Plinio Souza da Cruz não é novato na gestão municipal. Até 2024, ele foi vice-prefeito da cidade e participou ativamente da administração anterior, liderada por Saul Nunes Bemerguy. E que administração exemplar, não?
Bemerguy chegou a ser afastado do cargo em 2021 por uma investigação da Polícia Federal que apurava fraudes em licitações, desvio de recursos, corrupção e lavagem de dinheiro. O ex-prefeito montava os processos licitatórios depois de receber os repasses federais e, ao final, repassava o dinheiro a empresários do esquema, que devolviam parte do lucro.
Em julho de 2021, a PF bateu na porta da prefeitura e levou não só o prefeito, mas também secretários e funcionários de alto escalão, suspeitos de integrarem a organização criminosa. Agora, o seu ex-vice assume a prefeitura e, coincidentemente, em seu primeiro mês, já distribuiu R$ 4 milhões em contratações sem licitação. Como dizem, o fruto não cai longe do pé.
E o dinheiro do contribuinte?
A Lei 14.133/2021 estabelece princípios como isonomia, moralidade, transparência e eficiência na administração pública. Mas parece que esses conceitos ficaram no papel em Tabatinga. Afinal, quando se trata de gastar dinheiro público, a pressa é grande, a documentação é flexível e os beneficiários são sempre os mesmos.
Aliás, por falar em transparência e zelo pelo dinheiro público, vale lembrar um episódio que aconteceu no último dia 28 de janeiro. A Polícia Federal deflagrou a Operação Transparência, mirando um grupo criminoso especializado em fraudes à licitação e desvio de dinheiro público. Os alvos? O escritório da Comissão Permanente de Licitação da Prefeitura de Tabatinga e a Secretaria de Administração do Município. Foram cumpridos cinco mandados de busca e apreensão, resultando na coleta de computadores, dinheiro em espécie, joias e aparelhos eletrônicos. Curiosamente, no mesmo período, as dispensas de licitação estavam sendo feitas pelo mesmo grupo político que comandou Tabatinga nos últimos meses. Coincidência? Talvez. Mas há quem diga que o cronograma de operações e os contratos milionários parecem ter um timing perfeito.
A população de Tabatinga, enquanto isso, segue esperando por melhorias reais. Mas ao que tudo indica, a prioridade da nova gestão é outra. Aguardemos as cenas dos próximos capítulos.
Veja documentos:
Confira reportagem do Portal e TV CM7 Brasil: