Ministros e funcionários não sabem como encarar transição de governo
BRASÍLIA — A poucos dias do provável afastamento de Dilma Rousseff da Presidência da República pelo Senado, seus auxiliares se dividem entre os que ameaçam boicotar o eventual governo de Michel Temer e os que se mostram perdidos em meio a relatórios, sem saber a quem entregar. Num afã de vingança, um ministro chegou a sugerir que os arquivos sejam deletados, e o grupo do vice que se vire atrás de documentos e registros governamentais. Outro grupo prepara arquivos com a “memória do governo”, contratos assinados, a vencer e em andamento, mas não tem a mínima ideia com quem deixá-los. Um ministro conta que, em uma reunião, um colega chegou a propor a organização de uma transição formal, mas foi rechaçado pelos presentes.
Enquanto a situação não se define no Planalto, auxiliares do vice se movimentam nos subterrâneos em busca do máximo de informações para montar o novo governo. Sem um organograma de todos os cargos existentes na esfera federal e, em especial, nos conselhos das estatais, onde são pagos “jetons” — usado como moeda de troca nas negociações de cargos —, uma pessoa próxima a Temer cuida do levantamento.
— É uma situação atípica. Temos que assumir com o carro andando, estar com tudo pronto, mas não podemos pedir formalmente as informações — justificou um peemedebista.
Entre os funcionários governistas, há dúvidas sobre a conveniência de anteciparem suas exonerações ou esperarem que o novo governo assuma e demita os numerosos cargos de confiança, conhecidos como DAS, para que sejam ocupados por aliados. Os ministros, secretários e assessores mais tarimbados, detentores das maiores gratificações, devem pedir demissão no mesmo dia da votação do plenário do Senado ou no dia em que Dilma for notificada sobre a decisão. Já os servidores não concursados, detentores dos cargos mais baixos, pretendem aguardar a decisão de Temer.
— Como é que eu vou pedir para sair, se, ainda que afastada, Dilma está presidente? Entregar o cargo é aceitar que ela será deposta ao final do processo — argumenta um funcionário de confiança de Dilma.
Um funcionário de carreira, que acompanhou a transição dos governos Fernando Henrique para Lula comenta as diferenças de ambiente no terceiro andar do Planalto, onde Dilma despacha, e a Vice-Presidência, no subsolo:
— Lá para cima está um clima bem ruim, melancólico. Na vice é um entra e sai de começo de governo.
Apesar das dúvidas sobre a saída do governo, já há um movimento discreto de caixas sendo organizadas e levadas embora. Entre os servidores palacianos, o clima é de luto. Uma pessoa que trabalha no gabinete da presidente notou:
— Aqui não tem um telefone tocando.